sexta-feira, 15 de junho de 2007

As Bençãos da Reencarnação

VIDA E AMOR

A cena desenrolou-se há quase cinco anos.
O apelo vinha de longe. O cansaço da velha amiga se lhe desenhava no rosto. E o rosto dela se nos reflectia no espelho da mente.
Era D. Maria Eugénia da Cunha, que eu conhecera menina e moça em meus últimos tempos no Rio. Lembrava-nos a afeição, rogava socorro espiritual. A jovem de outra época era agora uma viúva, pobre, residindo por favor com o filho único, recém-casado.
O chamamento lhe fluía do ser, em nossa direcção: "Meu amigo, em nome de Jesus, se é possível, auxilie-me... Não aguento mais!"
Utilizando os recursos do desencarnado, quando pode ganhar distância e tempo, fomos vê-la e encontramo-la, arrasada de angústia, ante as invectivas da nora. Maria Cristina, a boneca que lhe desposara Júlio, o filho que ela preparara com tanto mimo para a vida, não considerava nem mesmo a tempestade, lá fora, e ordena:
- E a senhora saia daqui hoje...
- Mas hoje? Com esta noite? - arrazoava a sogra, em pranto.
- Estou farta, se eu fosse velha moraria no asilo!
- Preciso ver meu filho..
- Isso é que não. Quem manda nesta casa sou eu...
- Sou mãe.
- Seja o que for, saia daqui. A senhora tem sua irmã no Leblon, tem sobrinhos em Madureira... Pode escolher.
- Maria Cristina!...
- Não dramatize
- Afinal, você me expulsa deste modo?! Que fiz eu?
- Não vou com a sua cara.
- Minha filha, pelo amor de Deus, não me atire assim pela porta fora...
- Arranque-se daqui ou não respondo pelo que possa acontecer.
- Júlio!...Quero ver Júlio!...
- A senhora não mais envenenará meu marido com as suas conversas...
- Ah! Meu Deus!...
- Não se escore em Deus para mudar de assunto. Saia agora!
- Preciso arranjar minhas coisas, minha roupa...
- Nada disso... Amanhã, a senhora telefone, que eu mando seus cacarecos...
- Não posso sair assim...
- Vamos ver quem pode mais... Colocando algum dinheiro nas mãos da sogra, sacudiu-a com violência e, em seguida, puxou-a até a porta e gritou:
- Vá de táxi, vá de ônibus, vá como quiser, mas desapareça!
Inútil qualquer tentame de socorro. A moça, transtornada, não assimilava qualquer apelo à misericórdia.
Num momento D. Maria Eugénia se viu empurrada para a rua. A pobre cambaleou, arrastou-se, e, mais alguns minutos de chuva e lágrimas nos olhos, o desastre... Projectada ao longe por pesado veículo veio a fractura mortal.
No dia seguinte, identificada pelo filho numa casa de pronto-socorro, largou-se do corpo ao anoitecer.
Abateu-se o infortúnio sobre o casal.

Júlio e Maria Cristina passaram à condição de doentes da alma. Por mais que a mulher engenhasse a escapatória, asseverando que a sogra teimara em sair em visita à irmã, debaixo do aguaceiro, o esposo desconfiava. Desconfiava e sofria.
D. Maria Eugénia, porém, na Espiritualidade, compadeceu-se dos filhos e, conquanto enriquecida de protecção e carinho, não se sentia tranquila ao sabê-los em desentendimento e dificuldade. Repetia preces, mobilizou relações e, depois de quatro anos, venceu o problema, tornando, de novo, à Terra...
Hoje, fui ver a velha amiga renascida no Rio. Renasceu de Júlio e Maria Cristina, lembrando uma flor de luz no mesmo tronco familiar. Os pais felizes, agindo intuitivamente, deram-lhe o mesmo nome: Maria Eugénia. O jovem progenitor beijava-a enternecido e a ex-nora, transfigurada em mãezinha abnegada, guardava-a sobre o próprio seio, com a ternura de quem carrega um tesouro.
Meditava nos prodígios da reencarnação, à frente do trio, quando o irmão Felisberto, que me acompanhava, falou, entre a alegria e a emoção:
- Veja, meu amigo! Não adianta brigar, condenar, ofender, perseguir... A lei de Deus é o amor e o amor vencerá sempre.
Irmão X

3 comentários:

  1. ESQUECIMENTO PROVIDENCIAL

    Ouve-se, frequentemente, proferida pelas pessoas ultrajadas ou sofridas, a sentença: "Perdoar, não me é difícil; no entanto, esquecer, é-me quase impossível."
    Sem o real esquecimento da ofensa, não vige o verdadeiro perdão.
    A lembrança da ocorrência malsã demonstra a permanência da mágoa que, oculta ou declarada, anela pelo ressarcimento do mal padecido.
    Quando o coração se sente lenido pelo entendimento do facto infeliz; quando a compreensão compassiva luariza a memória do instante perturbador, o esquecimento toma corpo na criatura e o perdão legítimo se lhe estabelece, ensejando a harmonia que proporciona ao ofensor a oportunidade para a reparação.
    O olvido dos acontecimentos nefastos significa valiosa conquista do espírito sobre si mesmo, superando as imposições inferiores do ego e facultando o desenvolvimento das aptidões superiores, que jazem inatas na criatura.
    Toda a permanência no mal engendra anseios de desforço, aspirações de cobrança...
    Dedicar-se ao equilíbrio psicofísico mediante a harmonização interior, eis o grande desafio para o homem inteligente, que aspira por tentames mais grandiosos, tendo os olhos postos no infinito.
    O cultivo das ideias optimistas, positivas, contribui para a superação, para o esquecimento dos desaires, nas recordações nefastas.
    Mediante treinamento mental e exercício emocional nas actividades do Bem, é factível o olvido das questões negativas, graças às quais, no entanto, o individuo amadurece (emocionalmente), adquire experiência, evolui no processo de conscientização superior.

    (continua)

    ResponderEliminar
  2. (continuação)

    É providencial o esquecimento do passado, das reencarnações anteriores. Graças a ele, as dificuldades que ressumam do inconsciente profundo, em forma de animosidade e antipatia, de ressentimento e insegurança, tornam-se mais fáceis de ser vencidas, administradas na leitura da renovação interior. Tivéssemos conhecimento lúcido das razões que as desencadearam no pretérito; soubéssemos com clareza das ocorrências que a geraram; recordássemos dos momentos em que sucederam e das circunstâncias em que se deram e se constituiriam verdadeiros impedimentos para a pacificação, para o equilíbrio emocional, para o perdão.
    Ademais, a recordação das cenas antes vividas, não ficaria adstrita apenas à personagem central interessada, mas também às outras pessoas que dela participaram, gerando situações amplas e de complexos conflitos.
    Ninguém se sentiria em segurança, sabendo que seus equívocos e erros de ontem eram agora recordados por outras pessoas. Tal fenómeno produziria estados humilhantes para alguns, ou, quando menos, profundamente desagradáveis para todos que se encontrassem neles incursos.
    Assim considerando, vale a pena ter-se em mente que a soma das experiências anteriores, perturbadoras, com as actuais, produziria tão pesada carga emocional, que a harmonia mental se desconcertaria, interferindo no conjunto social, que ficaria gravemente afectado.
    O esquecimento, portanto, do passado espiritual, é providencial para o ser no seu processo de crescimento.
    ... E não apenas no que diz respeito aos quesitos perturbadores, mas também às acções de enobrecimento, de renúncia que poderiam surpreender a criatura, levando-a à jactância ou à presunção, ou ao marasmo, por facultar-lhe pensar na desnecessidade de mais esforçar-se para prosseguir na conquista de outros elevados patamares.

    (continua)

    ResponderEliminar
  3. (continuação)

    A reencarnação é processo de evolução trabalhado pela misericórdia de Deus, que estabeleceu, no esquecimento, o valioso recurso para mais ampla aprendizagem e treinamento para o perdão real.
    Não obstante, à medida que o Espírito progride, tornar-se-lhe mais lúcida a percepção e ele recorda ocorrências que podem contribuir para o seu progresso, ou conclui, mediante análise dos factos actuais que lhe oferecem parâmetros para identificar os do passado.
    Assim, o verdadeiro perdão somente é possível quando ocorre o olvido pleno ao mal de que se foi objecto.

    "Desperte e seja Feliz" - Joana de Ângelis/Divaldo Franco (pág. 113 a 116)

    ResponderEliminar